Retrato de Portugal hoje

Miguel S. TavaresSegunda-feira passada, a meio da tarde, faço a A-6, em direcção a Espanha e na companhia de uma amiga estrangeira;quarta-feira de manhã, refaço o mesmo percurso, em sentido inverso, rumo a Lisboa. Tanto para lá como para cá, é uma auto-estrada luxuosa e fantasma. Em contrapartida, numa breve incursão pela estrada nacional, entre Arraiolos e Borba, vamos encontrar um trânsito cerrado, composto esmagadoramente por camiões de mercadorias espanhóis. Vinda de um país onde as auto-estradas estão sempre cheias, ela está espantada com o que vê:
– É sempre assim, esta auto-estrada?
– Assim, como?
– Deserta, magnífica, sem trânsito?
– É, é sempre assim.
– Todos os dias?
– Todos, menos ao domingo, que sempre tem mais gente.
– Mas, se não há trânsito, porque a fizeram?
– Porque havia dinheiro para gastar dos Fundos Europeus, e porque diziam que o desenvolvimento era isto.
– E têm mais auto-estradas destas?
– Várias e ainda temos outras em construção: só de Lisboa para o Porto, vamos ficar com três. Entre S. Paulo e o Rio de Janeiro, por exemplo, não há nenhuma: só uns quilómetros à saída de S. Paulo e outros à chegada ao Rio. Nós vamos ter três entre o Porto e Lisboa: é a aposta no automóvel, na poupança de energia, nos acordos de Quioto, etc. – respondi, rindo-me.
– E, já agora, porque é que a auto-estrada está deserta e a estrada nacional está cheia de camiões?
– Porque assim não pagam portagem.
– E porque são quase todos espanhóis?
– Vêm trazer-nos comida.
– Mas vocês não têm agricultura?
– Não: a Europa paga-nos para não ter. E os nossos agricultores dizem que produzir não é rentável.
– Mas para os espanhóis é?
– Pelos vistos…
Ela ficou a pensar um pouco e voltou à carga:
– Mas porque não investem antes no comboio?
– Investimos, mas não resultou.
– Não resultou, como?
– Houve aí uns experts que gastaram uma fortuna a modernizar a linha Lisboa-Porto, com comboios pendulares e tudo, mas não resultou.
– Mas porquê?
– Olha, é assim: a maior parte do tempo, o comboio não ‘pendula’; e, quando ‘pendula’, enjoa de morte. Não há sinal de telemóvel nem Internet, não há restaurante, há apenas um bar infecto e, de facto, o único sinal de ‘modernidade’ foi proibirem de fumar em qualquer espaço do comboio. Por isso, as pessoas preferem ir de carro e a companhia ferroviária do Estado perde centenas de milhões todos os anos.
– E gastaram nisso uma fortuna?
– Gastámos. E a única coisa que se conseguiu foi tirar 25 minutos às três horas e meia que demorava a viagem há cinquenta anos…
– Estás a brincar comigo!
– Não, estou a falar a sério!
– E o que fizeram a esses incompetentes?
– Nada. Ou melhor, agora vão dar-lhes uma nova oportunidade, que é encherem o país de TGV: Porto-Lisboa, Porto-Vigo, Madrid-Lisboa… e ainda há umas ameaças de fazerem outro no Algarve e outro no Centro.
– Mas que tamanho tem Portugal, de cima a baixo?
– Do ponto mais a norte ao ponto mais a sul, 561 km.
Ela ficou a olhar para mim, sem saber se era para acreditar ou não.
– Mas, ao menos, o TGV vai directo de Lisboa ao Porto?
– Não, pára em várias estações: de cima para baixo e se a memória não me falha, pára em Aveiro, para os compensar por não arrancarmos já com o TGV deles para Salamanca; depois, pára em Coimbra para não ofender o prof. Vital Moreira, que é muito importante lá; a seguir, pára numa aldeia chamada Ota, para os compensar por não terem feito lá o novo aeroporto de Lisboa; depois, pára em Alcochete, a sul de Lisboa, onde ficará o futuro aeroporto; e, finalmente, pára em Lisboa, em duas estações.
– Como: então o TGV vem do Norte, ultrapassa Lisboa pelo sul, e depois volta para trás e entra em Lisboa?
– Isso mesmo.
– E como entra em Lisboa?
– Por uma nova ponte que vão fazer.
– Uma ponte ferroviária?
– E rodoviária também: vai trazer mais uns vinte ou trinta mil carros todos os dias para Lisboa.
– Mas isso é o caos, Lisboa já está congestionada de carros!
– Pois é.
– E, então?
– Então, nada. São os especialistas que decidiram assim.
Ela ficou pensativa outra vez. Manifestamente, o assunto estava a fasciná-la.
– E, desculpa lá, esse TGV para Madrid vai ter passageiros? Se a auto-estrada está deserta…
– Não, não vai ter.
– Não vai? Então, vai ser uma ruína!
– Não, é preciso distinguir: para as empresas que o vão construir e para os bancos que o vão capitalizar, vai ser um negócio fantástico! A exploração é que vai ser uma ruína – aliás, já admitida pelo Governo – porque, de facto, nem os especialistas conseguem encontrar passageiros que cheguem para o justificar.
– E quem paga os prejuízos da exploração: as empresas construtoras?
– Naaaão! Quem paga são os contribuintes! Aqui a regra é essa!
– E vocês não despedem o Governo?
– Talvez, mas não serve de muito: quem assinou os acordos para o TGV com Espanha foi a oposição, quando era governo…
– Que país o vosso! Mas qual é o argumento dos governos para fazerem um TGV que já sabem que vai perder dinheiro?
– Dizem que não podemos ficar fora da Rede Europeia de Alta Velocidade.
– O que é isso? Ir em TGV de Lisboa a Helsínquia?
– A Helsínquia, não, porque os países escandinavos não têm TGV.
– Como? Então, os países mais evoluídos da Europa não têm TGV e vocês têm de ter?
– É, dizem que assim entramos mais depressa na modernidade.
Fizemos mais uns quilómetros de deserto rodoviário de luxo, até que ela pareceu lembrar-se de qualquer coisa que tinha ficado para trás:
– E esse novo aeroporto de que falaste, é o quê?
– O novo aeroporto internacional de Lisboa, do lado de lá do rio e a uns 50 quilómetros de Lisboa.
– Mas vocês vão fechar este aeroporto que é um luxo, quase no centro da cidade, e fazer um novo?
– É isso mesmo. Dizem que este está saturado.
– Não me pareceu nada…
– Porque não está: cada vez tem menos voos e só este ano a TAP vai cancelar cerca de 20.000. O que está a crescer são os voos das low-cost, que, aliás, estão a liquidar a TAP.
– Mas, então, porque não fazem como se faz em todo o lado, que é deixar as companhias de linha no aeroporto principal e chutar as low-cost para um pequeno aeroporto de periferia? Não têm nenhum disponível?
– Temos vários. Mas os especialistas dizem que o novo aeroporto vai ser um hub ibérico, fazendo a trasfega de todos os voos da América do Sul para a Europa: um sucesso garantido.
– E tu acreditas nisso?
– Eu acredito em tudo e não acredito em nada. Olha ali ao fundo: sabes o que é aquilo?
– Um lago enorme! Extraordinário!
– Não: é a barragem de Alqueva, a maior da Europa.
– Ena! Deve produzir energia para meio país!
– Praticamente zero.
– A sério? Mas, ao menos, não vos faltará água para beber!
– A água não é potável: já vem contaminada de Espanha.
– Já não sei se estás a gozar comigo ou não, mas, se não serve para beber, serve para regar – ou nem isso?
– Servir, serve, mas vai demorar vinte ou mais anos até instalarem o perímetro de rega, porque, como te disse, aqui acredita-se que a agricultura não tem futuro: antes, porque não havia água; agora, porque há água a mais.
– Estás a dizer-me que fizeram a maior barragem da Europa e não serve para nada?
– Vai servir para regar campos de golfe e urbanizações turísticas, que é o que nós fazemos mais e melhor.
Apesar do sol de frente, impiedoso, ela tirou os óculos escuros e virou-se para me olhar bem de frente:
– Desculpa lá a última pergunta: vocês são doidos ou são ricos?
– Antes, éramos só doidos e fizemos algumas coisas notáveis por esse mundo fora; depois, disseram-nos que afinal
éramos ricos e desatámos a fazer todas as asneiras possíveis cá dentro; em breve, voltaremos a ser pobres e enlouqueceremos de vez.
Ela voltou a colocar os óculos de sol e a recostar-se para trás no assento. E suspirou:
– Bem, uma coisa posso dizer: há poucos países tão agradáveis para viajar como Portugal! Olha-me só para esta autoestrada sem ninguém!

Carta de um pai

Faço questão de colocar estas palavras aqui. Não muda a situação mas pode indignar. Será que ainda temos a capacidade de nos indignarmos com estas notícias?
Carta escrita por Gilmar Yared pai de uma das vítimas do acidente
causado pelo Deputado Fernando Carli.
”Olá queridos amigos!
Vocês não imaginam a importância de ter amigos. Neste momento de muita dor, onde a tristeza tomou conta de minha alma, onde a vontade de viver dá lugar a de morrer, receber as muitas mensagens através de
telefonemas, e-mails tem sido um refrigério.
Ontem a equipe da TV paranaense esteve em minha casa, gravamos uma matéria que revelava bem a nossa indignação. Mas infelizmente cortaram e colocaram apenas o que não poderia repercutir ou seja nada comparado ao que falamos.
Vejo o Poder Publico sendo colocado à disposição do deputado para
diminuir as evidências deste crime.
No posto de gasolina onde praticamente tudo começou, o frentista
revelou que no dia seguinte onde nós chorávamos a morte de meu filho,
os advogados do deputado já estavam trabalhando recolhendo evidências.
Conversando com o frentista, o mesmo comentou que ouvindo a conversa deles, estes afirmavam que o deputado estava embriagado. No Hospital Evangélico, enfermeiros comentam que foi encontrada cocaína em seu sangue e tudo foi escondido pelas autoridades, médicos e imprensa.
Por que tanta impunidade? 190 km por hora foi a velocidade cravada no
velocímetro e o delegado responsável pelo caso, disse desmentindo as
primeiras informações oficiais que o velocímetro estava em zero.
Que poder é este que destrói a família?
O poder político não é maior que o poder de Deus e não pode estar
acima do bem e do mal.Meu irmão apresentador da TV Educativa, foi afastado de seu programa.Na CBN colegas jornalistas estão indignados com o cerceamento de informações.
Autoridades de nosso estado, com certeza vocês fizeram um pacto e não foi com Deus.
Imagino que haja pessoas decentes que irão reverter este quadro.
Sei que tudo irá passar e que enfrentarei muitos desafios a partir de agora.
Peço a Deus que nos dê forças e nos proteja.
Amigos, poderia estar acontecendo com qualquer um de vocês. Fui
escolhido para suportar tamanha dor acompanhado desta grande
injustiça. Obrigado pelas homenagens ao meu filho.”
Leiam sobre o nobre deputado:
O deputado estadual, de 26 anos, estava com a habilitação suspensa. Ele tinha 130 pontos na carteira. Nos últimos seis anos recebeu 30 multas, 23 por excesso de velocidade.

O que elege um político? Ao eleger um político que variáveis são usadas? Me pergunto o que levou esse rapaz, perdão, nobre autoridade, ao poder?!

Para pensar

Dizem que…
Em 1966 o presidente Castello Branco leu nos jornais que seu irmão, funcionário com cargo na Receita Federal, ganhara um carro Aero-Willys, agradecimento dos colegas funcionários pela ajuda que dera na lei que organizava a carreira.
O presidente telefonou mandando que ele devolvesse o carro.
O irmão argumentou que se devolvesse ficaria desmoralizado em seu cargo. O presidente Castelo Branco interrompeu-o dizendo:
‘Meu irmão, afastado do cargo você já está. Estou decidindo agora se você vai preso ou não’.

Os dekasseguis

A notícia que chega do Japão assusta. Fico imaginando os países em crise devolvendo os estrangeiros aos seus países de origem. Enquanto os dekasseguis foram úteis para ajudarem a economia japonesa a crescer, tudo bem. Agravou-se a economia, vão para casa.
Nem todos os brasileiros no Japão mandaram dinheiro para o Brasil. Tem gente que se estabeleceu por lá e lutam contra o desemprego. Entendo a posição do governo japonês ao estimular a volta dos dekasseguis pois não é bom para o país ver essas pessoas desempregadas morando sob os viadutos,(ruim para os turistas), e, com muita sorte às vezes em casa de amigos.
Os que voltarem para o Brasil não precisam se preocupar. Com a ajuda do governo japonês, depois de pagar a viagem de volta, poderão viver tranquilamente por aqui por quase uma semana, já que estão acostumados a comer pouco, Quando precisarem receberão do governo várias bolsas, poderão ocupar terras que considerarem improdutivas, com o apoio do governo, ou ainda resta a possibilidade de criarem um partido político, angariarem fundos entre os mais afortunados conterrâneos e levarem a vida numa boa. Tem saída. Pelo menos espaço não falta por aqui.